sábado, 21 de fevereiro de 2015

O Movimento Negro que Vi

Da quase inutilidade das instituições de luta por igualdade racial nos aparelhos de Estado

Objetivo com este texto analisar o papel das instituições públicas destinadas a luta contra o racismo e a igualdade do negro na sociedade brasileira. De imediato, admito a importância do  reconhecimento institucional do racismo no seio do Estado brasileiro, que a criação destas instituições representa. Entretanto este reconhecimento não induz de per si um posicionamento efetivo do conjunto da sociedade. Isto porque as forças políticas que dirigiram o país após a ditatura não tinham a questão das desigualdades raciais como centro do enfrentamento político.

Nos últimos anos, a luta contra o racismo ganhou aliados importantes. O Estado, através de novas instituições, tais como coordenações, superintendências, secretarias e mesmo ministério, engajou-se para construir políticas que buscam-se a minorar as desigualdades entre segmentos sociais. Entretanto, neste mesmo período, a racismo não retrocedeu, ao contrário, aumentou, sofisticando-se.

O assassinato de 13 jovens negros em Salvador se soma aos de mais 50 mil negros anualmente ocorridas no Brasil. E chama a atenção para a constatação da inutilidade que representam os aparelhos de Estado criados nos últimos anos no Brasil para lutar pela igualdade de tratamento dos jovens de todos os segmentos sociais. O aumento do assassinato dos jovens negros aumenta na direção inversa da dos jovens não negros. As tais coordenações, superintendências, secretárias e ministérios são impotentes para interromper este genocídio.

Tais instituições estão inseridas na lógica de legitimação das elites culturais. Elas se alimentam de uma cultura que vem nos outros a causa de seus males. O complexo do bode expiatório está na base da construção da cosmogonia da cultura cristã-ocidental. No mito inicial do bem e do mal,  o Senhor culpou Adão, Adão culpou Eva, e esta culpou a serpente. Nos, Afro-brasileiros, culpamos os outros pelos nossos males, logo, tais instituições vem racismo em tudo que não lhes assemelham.

Neste sentido, não compreendem que o racismo é uma forma de restrição à liberdade, que tem como intenção subjugar qualquer segmento com potencial de ameaçar a hegemonia cultural estabelecida. As estratégias utilizadas vão desde o controle social à exterminação dos segmentos racializados.  O apartheid na África do Sul e o genocídio do judeu na segunda guerra são os dois exemplos destes extremos. No Brasil, estas duas formas vem sendo utilizadas, representadas, no caso do controle social pela disseminação do uso do crack e no outro, caso pelo genocídio de jovens negros.

Estou convencido que as instituições criadas nos aparelhos dos Estados e da união são quase inúteis para fazer avançar a luta contra o racismo. Prestam-se quase que exclusivamente para acomodar algumas lideranças a fim de neutralizá-las. Esta neutralização não se esgota em si mesma, vai na direção da paralisação das entidades em que essas lideranças se referenciavam. No caso da Bahia, serve de negociata para acomodação de grupos políticos. Em fim, recuperam pessoas e lideranças.

Assim, tocam alguns projetos, sem  importância estratégica; captam alguns recursos e distribuem para algumas organizações das quais são próximas. Financiam a produção de alguns estudos. Seus dirigentes angariam prestígio em organizações da sociedade civil, sendo algumas vezes convidados para proferir conferências. Estas organizações não foram capazes de mostrar a eficiência da economia popular, dos laços de solidariedade, em resumo da “vida sistêmica dos excluído”, e por isso, são incapaz de articular apoio.

Não Influenciam a política de segurança que ceifou milhares de jovens negros nos últimos anos. Não influenciam na politica tributária que esfola indiretamente o empreendedor popular afro-brasileiro. Não influenciam  a política monetária que discrimina os empreendedores afro-brasileiro com taxas juros criminosas. Não influenciam a política educacional no geral e, em especial, na Lei 10.639/2003, única capaz de mudar o país. Se calam diante da omissão do Estado no combate a dizimação da juventude Afro-brasileira no uso das drogas, sobretudo o crack, que se assemelha a uma politica de Estado, muito semelhante à “solução final”.

No caso especifico da Bahia, entre todas as ausências destes órgãos três chegam ao absurdo. Primeiro, o Estatuto da Igualdade Racial ficou engavetado durante quase oito anos, mesmo tendo gestores oriundo do MNU na Secretaria da Promoção da Igualdade – SEPROMI. Mesmo tendo vários quadros oriundos do movimento Negro nos aparelhos do estado, a sociedade não viu andar a implantação da Lei 10.639/2003. A Bahia tem uma triste posição de destaque no genocídio da juventude afro-brasileira.

Portanto, considero desnecessárias as estruturas administrativas atuais para a luta contra a discriminação dos Afro-brasileiros. O papel de empregador que ele exerce pode muito bem  ser preservado em estruturas mais leves e independentes. No entanto, é recomendável que a sociedade acompanhe de perto o desempenho do estado no combate às desigualdades entre os segmentos sociais. Para isso, proponho que todos os órgãos de execução de políticas públicas tenham assessorias dedicadas ao aconselhamento na luta contra a discriminação dos afro-brasileiros.


Em resumo, no caso do Brasil, só a construção de uma contra hegemonia será capaz de produzir eficácia na luta contra o racismo.

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