quinta-feira, 23 de junho de 2011

O MOVIMENTO NEGRO QUE VI: a crise do movimento negro

A CRISE DO MOVIMENTO NEGRO

Em alguns debates houve-se a afirmação que o Movimento Negro vive uma forte crise. Não somos de acordo. Quando compreendemos o Movimento Negro como o conjunto de entidades e organizações que se dedicam ou dedicam espaços em seu interior para a luta contra a discriminação dos Afrobrasileiros.

Atribui-se a crise a cooptação pelo estado das organizações e de seus militantes. Esta história de cooptação dos movimentos pelos governos ou partidos esquerda é uma incapacidade de enxergar a dinâmica do MN. Sempre houve algum tipo cooptação de em todos os movimentos políticos em graus diferentes, sem que isto pudesse intervir na dinâmica geral destes movimentos.

Para melhor compreensão de nossa posição é preciso destaque que incluímos no movimento negro: organizações culturais, como os blocos afros, organizações, políticas como o MNU, organizações não governamentais que prestam inestimáveis serviços, como as ONGs.

O Movimento Negro vive seu melhor momento. Dezenas de ONG prestando serviços aos necessitados. Espaços institucionais de grande envergadura: Ministérios, Secretarias, Superintendências, todos construídos em decorrência de trabalho sérios dos militantes. Fora deste quadro, temos Ministros Negros, não sem pasta como nos governos da elite cultural conservadora; poderosos secretários de finanças, no caso da Bahia.

No que diz respeito às políticas. Elas abundam. Cotas raciais nas universidades e, agora também, em alguns estados no serviço público; políticas sociais transversais para negros, mulheres, homossexuais; leis diretamente editadas para os afrobrasileiros; políticas de apoio às comunidades quilombolas.

Estas conquistas não foram obtidas da noite para o dia. Nem é o resultado apenas dos últimos dez anos. Ele foram construídas de forma lenta, gradual e segura.

Com efeito, o movimento social, desde o aparecimento do Ilê Aiyê foi, em 1974, passando pela fundação do Movimento Unificado Contra a Discriminação Racial, em 1978, até chegarmos às poderosas Organizações Não Governamentais; muitas estruturas serão construídas.

No espaço institucional, podemos anotar a Comissão do Negro do Partido dos Trabalhadores em São Paulo, 1982; Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra, 1984 en São Paulo; a Comissão de negros do Partido dos Trabalhadores 1985 no caso da Bahia; o Primeiro Encontro de Negro do Partido dos Trabalhadores em Brasília, em 1986. Desde o inicio dos anos noventa as principais centrais sindicais vem construindo organismo internos para debater a questão racial.

Na academia, começamos com os estudantes negros das universidades paulistas, no final dos anos setenta. Nos anos noventa tivemos o Primeiro SENUM, realizado Faculdade de Arquitetura, na Bahia, marco importante da luta dentro das universidades. Entre 2000 e 2010, tivemos cinco congressos da ABPN. Na Bahia tivemos dois congressos da APNB, o primeiro em 2007 e o segundo em 2009.

Ainda na academia, merece destaque o trabalho do CEAO. Foram 50 anos de proficua produção, que vai redundar na sua transformação em instituto. O CEPAIA vem, desde 1996, construido espaços de produção. Depois desta duas experiencias pioneiras, os NEAB se proliferam por toda academia, procurando integrar os jovens intelectuais negros na produção de conhecimentos em novas bases epistemoligicas.

A legislação progrediu bastante. Assim, da lei Afonso Arinos que nunca puniu nenhum ato de discriminação, passamos pela Lei CAO e a lei 10639/2003, chagando ao estatuto da igualdade racial, tivemos enorme progresso.

Para coroar estas vitórias, colocamos o “Vinte de Novembro” na agenda brasileiro.

Em suma:

Apenas as entidades que se colocam no campo político strictu senso encontram-se efetivamente em crise. As vitórias alcançadas foram frutos de diversas alianças com instituições estatais, que minimizaram a disputa de poder com estas entidades. Por isso, elas perderam o eixo diante das conquistas obtidas pelo rico e diversificado movimento negro. Portanto, encontram-se em crise, procurando unificar, através da criação "organizações políticas" ou mega eventos políticos.

Um comentário:

  1. Professor Nilo Rosa, obrigado por esse texto magnífico. Poucas análises conseguem dar conta da trajetória do Movimento Negro brasileiro, e posso assegurar que saio um pouco menos desesperançoso frente aos desafios existentes, nesse processo de luta pela promoção da igualdade racial em nosso país.

    São textos como esses que me levam a refletir sobre a negligência dos partidos de esquerda em relação a seus quadros Negros mais qualificados.

    É vergonhoso, partidos como PT e PCdoB com militantes históricos do naipe de Nilo Rosa, Sergio São Bernardo, Olivia Santana, Moisés Rocha dentre outros/as, simplesmente não investirem em seus nomes, em termos de publicidade e exposição na mídia, da mesma forma que o fazem com os Peleguinhos e Alices de seus partidos.

    Seria no mínimo injusta e perversa, a justificativa de que nas eleições passadas, os candidatos/as Negros/as não receberam uma quantidade de votos suficiente, para desbancarem as candidaturas brancas de seus respectivos partidos. Seria importante revermos quanto da verba partidária e lobby político, junto a empresários/as, foi investido para que as candidaturas Negras pudessem disputar em pé de igualdade aquele pleito.

    Essa conversa de que Negro/a não vota em Negro/a é uma balela, um sofisma que o Partido dos Trabalhadores desconstruiu ao eleger por duas vezes seguidas um trabalhador, consagrando inclusive sua sucessão com uma candidata escolhida por esse mesmo Trabalhador. Lembram-se do famoso “Trabalhador não vota em Trabalhador”? Lembram-se da importância de Duda Mendonça e demais marketeiros nesse processo de ressignificação da imagem do trabalhador Lula? Ou seja, é sabido por esses mesmos partidos de esquerda a importância VITAL da publicidade para impulsionarmos candidaturas.

    Durante as eleições passadas, verifiquei um amplo shopping a céu aberto de candidatos. Arriscaria dizer que apenas uma das “lojas” em questão era Negra e competia em pé de igualdade com os demais postulantes aos cargos de Deputado/a. Observei que a maioria das candidaturas Negras estavam praticamente por sua conta própria, não me pareciam ser tratadas como prioridade por seus respectivos partidos.
    O que me leva a seguinte afirmação: Os partidos de esquerdas estão empenhados em suas agendas brancas, desconhecendo o potencial de transformação sócio racial de candidatos do nível de Sergio São Bernardo, Nilo Rosa, Olívia Santana e tantos/as outros/as. Irrelevante dizer que os partidos de direita agem de acordo com nossa expectativa, portanto deles não falo aqui. Espantosa são a conivência e omissão da esquerda frente a um tema que tem ceifado vidas em nosso município e Estado.

    Seria redundante, após esse breve comentário declarar que não considero revolucionário um partido que não priorize candidaturas Negras e programa de enfrentamento ao racismo e promoção da igualdade racial. Exatamente por tudo isso, dando seguimento a nossa prática secular, a ‘Campanha Aperte o Branco!’ declara que anular o voto nessas circunstâncias corresponde não legitimar a negligência e omissão dos partidos de esquerda a um dos projetos políticos que nos é mais caro: A priorização do enfrentamento ao racismo, bem como a promoção da igualdade racial no município de Salvador.

    Já que é para votarmos em branco, votaremos no botão ‘branco’ das urnas, anulando dessa forma a legitimação dos projetos brancos dos partidos que sonhávamos serem mais sensíveis as nossas questões.

    Chega de segurar bandeira de branco.

    Aperte o Branco e anule a legitimação dos discursos e projetos brancos dessa esquerda que permanece em dívida com os anseios das comunidades Negras. Votar em seus candidatos representa nossa omissão diante da maneira debochada como são tratadas as demandas raciais, bem como suas representações.

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