sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Capitalismo excludente

A expressão título -  Capitalismo excludente - não faria sentido se fosse para explicar a natureza do sistema hegemônico na economia mundo. Mas esta não é nossa intenção. Pretendemos tão somente demonstrar a forma de geração de riqueza hegemônica entre nós, que muitos insistem em chamar de capitalismo, mas que para nós é melhor  caracterizado por este titulo paradoxal. Este paradoxo explica-se pelo fato de o capitalismo em sua lógica buscar a inclusão, salvo as exceções que são amparadas pelo estado do bem estar social. O nosso sistema, portanto, constrói o processo de exclusão.

Vamos  demonstrar esta aberração, procurando explorar as relações culturais dentro do mercado. A  passagem a  seguir na música dos Racionais Mc´s, ´´Estou ouvindo alguém me  chamar``, dá bem a  conta de onde pretendemos chegar:

Ele tinha um certo dom pra comandar.
Tipo, linha de frente em qualquer lugar.
Tipo, condição de ocupar um cargo bom e tal.
Talvez em uma multinacional.
É foda, pensando bem que desperdício.
Aqui na área acontece muito disso.
Inteligência e personalidade, mofando atrás da porra de uma grade.

Jerry Z. MULLER tem uma observação a respeito do sucesso dos judeus no capitalismo que se adapta muito bem para a realidade dos Afro-brasileiros, qual seja: ´´sempre que pudemos competir em pé de igualdade com os demais seguimentos sociais, fomos bem sucedidos``. Não é a toa que a esmagadora maioria dos negros de alta classe média é de funcionários de instituições públicas de prestigio (SRFB, MP, IES, dentre poucas), onde a regra de acesso dispensa julgamento subjetivo, vale apenas o concurso público. Neste processo apenas o mérito é levado em consideração.
No capitalismo de fato é possível verificar e punir severamente aqueles que trabalham contra o sistema. Neste capitalismo, a instituição economia tem papel preponderante, é ela que determina as relações entre os agentes. Um exemplo típico foi a punição ao Coutrywide, divisão do “Bank of America”, que discriminou mais de 200 mil negros e hispânicos, exigindo taxas mais elevadas para obtenção de crédito, e foi multada em mais de 300 milhões de dólares. Neste capitalismo é o estado que regula a relação entre os agentes, por isso, ação do Departamento de Justiça foi exemplar.

No capitalismo excludente, quem determina a relação entre os agentes é a “instituição cultural”, através da violência física, política e institucional com base no racismo, no machismo  etc. Por isso, um afro-brasileiro foi assassinado na porta de uma agencia bancária de uma instituição privada e nada  aconteceu, o assassino sai protegido por policiais. No capitalismo excludente o mercado tem a instituição cultural extremamente hipertrofiada. Isto é, a cultura determina as relações de trocas, sejam materiais ou simbólicas. Por isso, o mercado será nosso objeto especial de atenção.


Não é possível discutir capitalismo sem definirmos o elemento fundamental deste sistema que é o mercado. Mercado deve ser  entendido como “uma estrutura modelada por várias instituições (políticas, econômicas, sociais e mesmo culturais)” - Étienne Balibar. Estas estruturas determinarão o comportamento dos agentes. Assim, cada sociedade terá uma estrutura de mercado de acordo com o tipo de dominação cultural nela existente.

Os próceres das elites culturais, embora não definam mercado, proclamam sua soberania. Alguns, da corrente progressista, definem mercado como a “rede de relações de troca que se estabelece em função de um modo determinado de produção...”. Não se pode reduzir as relações no mercado apenas ao modo de produção nele hegemônico. Outros menos progressistas têm uma visão de mercado ajustadas às realidades do processo econômico. Chegam ao ponto de associar a ideia de mercado à liberdade sem mencionar, contudo, quem será o agente que garantirá a liberdade.

Neste mercado dá-se a combinação dos fatores de produção: Terra, Capital e Trabalho. Os dois últimos fatores serão objeto de nossos comentários. De fato, capital e trabalho são fundamentais para a lógica do desenvolvimento e do crescimento. É da combinação ideal destes fatores que poderemos encontrar resposta para o nosso atraso. Em nossa economia o capital não se relaciona com o trabalho.

As instituições econômicas, agentes vitais do eixo econômico, estão baseadas na apropriação do produto coletivo através do Estado, da corrupção, na sonegação  de  impostos, dentre outras formas. Vamos explorar com mais detalhes alguns dos aspectos inerentes à reprodução do capital dentro desta esfera. Este eixo não é puro, pois alguns setores e segmentos com relações fortemente imbricadas com os países centrais do capitalismo guardam algumas características da produção capitalista nestes países.

Nesta instituições, a reprodução do capital obedece à lógica da diferença. Isto é, aqueles que se aproxima do modelo – Poliakov – são melhores recompensados, enquanto os outros, à medida que se afastam, têm recompensas inferiores. Por isso, a discriminação atinge quase todos os agentes da relação de produção, uma vez que o modelo perfeito não pode ser encontrado, nas sociedades colonizadas. Mas ele está presente no imaginário de todos.

Aqui, o lucro não é fator de eficiência dos recursos de produção, pois o fator de produção, mão-de-obra, não é escolhido de acordo com sua capacidade de dar retorno ao capital investido, nem por seus “atributos produtivos”, mas sim de acordo com a semelhança que ela guarda com o modelo. Não sendo o lucro decorrência da eficiência dos fatores de produção, fica a questão de como o capital se reproduz, uma vez que esta é a única forma de sobrevivência dos agentes econômicos no “sistema capitalista”.

É esta questão que responderemos, com base na relação que as elites culturais têm com o Estado. É se apropriando dos recursos gerados pela sociedade, através de mecanismos estatais, que estes grupos são capazes de acumular riquezas. Assim, através das concorrências, fraudulentas ou não, através das concessões de serviços públicos, através dos socorros a empresas falidas é que esses grupos transferem riquezas coletivas para entes privados.

Esta transferência é suficiente para garantir as medíocres produção e reprodução de riquezas – PIB -, mas ela tem de ser complementado com o outro papel do estado capitalista excludente, qual seja impedir a produção de riquezas pela sociedade passiva de Milton SANTOS. Os principais instrumentos são: o uso de uma legislação detalhista e complexa; de empecilhos ao direito de associação; da força policial para restringir o direito à produção de riqueza, em resumo  de restrições à liberdade. Por exemplo, a repressão aos empreendedores autônomos, chamados pejorativamente de trabalhadores informais, é o principal exemplo desta violação.

Em fim, a inteligência e personalidade de “Guina” – protagonista na música do Mc’s – só estará à disposição do país quando a luta contra a discriminação dos Afro-brasileiros for prioritária neste capitalismo excludente.


2 comentários:

  1. Excludente é a corrupção que tira dinheiro da saúde e da educação.

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  2. Excludente é a corrupção que tira dinheiro da saúde e da educação.

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